sexta-feira, 14 de março de 2014

Foi sem querer querendo

Dilma Rousseff será responsabilizada, política e judicialmente, por decisões gerenciais tomadas que causaram prejuízos milionários causados aos investidores das estatais do setor energético. Além de ser questionada pela “oposição” na campanha reeleitoral, a Presidenta e os dirigentes da Petrobras e Eletrobras têm tudo para ser alvo de ações, em tribunais de Nova York, cobrando suas responsabilidades diretas pela perda de valor de mercado das ações das companhias, por atos de incompetência estratégica, má gestão comprovada e até indícios concretos de corrupção.
 
Ontem, o chamado “Blocão” impôs uma super derrota do governo. Aliados descontentes e a oposição aprovaram a criação de uma CPI para investigar denúncias de corrupção da Petrobras na Holanda. Por 267 voos a favor, 28 contra e 15 abstenções, a Câmara vai verificar se é real a suspeita de que a SBM Offshore, transnacional holandesa, tenha pago propina a dirigentes estatal brasileira, para facilitar o negócio milionário do aluguel de plataformas flutuantes de petróleo. O caso é alvo de ações na Justiça dos EUA, Holanda e Reino Unido – o que pode ser fatal para o PT em plena campanha reeleitoral. O PT espera aparelhar a comissão, para que ela nada investigue...

O elevado custo na utilização de usinas termoelétricas, movidas a combustível fóssil, altamente poluente e caro, sob a desculpa de gerar energia durante a escassez de chuvas nos reservatórios já levanta suspeitas de ser uma ação proposital para beneficiar aliados do governo que controlam as térmicas. Quem garante que o valor a alto pago pelo governo não retorna, politicamente, na forma de “mensalões”? Na pior hipótese, a conta cara da operação errada é paga pela sociedade, via Tesouro Nacional. Mas é o consumidor, que fica com energia mais cara, e com risco de racionamento, quem sofre no final.

 
A maior burrada de todo o processo é a incompetência como é propositalmente gerenciado o potencial hidroelétrico. O governo permitiu a criminosa construção de 32 usinas pelo esquema de “fio d´água”, entre os anos 2000 e 2012. Apenas 10 foram feitas com reservatórios. O culpado indireto por isso é a enganadora militância ambiental e jurídica – que impedem que se aproveite o potencial hídrico corretamente. O esquema de fio d´água, em vez de reservatórios, impede que se faça uma mais correta gestão da água, em tempos de pouca chuva, como agora.
 
Embora tenha potencial energético e hídrico, o Brasil fica sem explorar corretamente essas duas qualidades, seja por burrice ou canalhice dos seus dirigentes políticos. No caso do setor energético, Dilma é propagandeada como a “gerentona” (desde a gestão oficial de Lula). Portanto, a Presidenta é a principal culpada por todos os erros. Tomara que, pelo menos, as urnas lhe façam a cobrança do prejuízo. Se não fizerem, a Justiça, certamente fora do Brasil, pode fazer.

Valladolid ‘forever’, por Luis Fernando Veríssimo, na velha mídia de hoje

Ao que me lembre, não consigo recordar de uma única época em que alguém não estivesse pilhando alguém, acima ou abaixo da linha do Equador...  Se os espanhóis pilharam os astecas, estes haviam pilhado os toltecas.  Por trezentos anos os mongóis pilharam e arrasaram cidades da Rússia à Europa orienta para fazer pastos para seus cavalos (literalmente).  Os piratas da costa norte –africana passaram outros trezentos anos pilhando a Europa meridional, da Grécia à Espanha.
Veríssimo está correto quanto aos fatos, mas o primeiro degrau a subir para fora do poço é ultrapassar o complexo de inferioridade, latente em toda América Latina.  Duzentos anos de revoluções sobre revoluções não nos levaram a lugar nenhum.  Estudar a revolução mexicana de 1911 é mergulhar em uma crônica de desperdício inútil.
Não há saída fora do trabalho sob leis estáveis.  Evolução precisa de tempo, mas, acima de tudo, necessita de educação abrangente, prática e não ideológica.
 
 


Valladolid é uma cidade de 300 mil habitantes no Noroeste da Espanha. Foi lá que se casaram e reinaram os monarcas católicos Isabel e Fernando, foi lá que viveu Miguel de Cervantes e morreu Cristóvão Colombo.
E foi lá que em 1550 e 1551, diante de uma junta de doutores e teólogos convocada pelo rei Carlos V, o historiador eclesiástico Juan Ginés de Sepúlveda e o frei Bartolomé de Las Casas se reuniram para debater a colonização espanhola do Novo Mundo e o que fazer com seus nativos, além de catequizá-los.
Las Casas voltara do Novo Mundo e tinha uma visão humanitária das suas populações subjugadas. Pregava a sua cristianização benévola. Sepúlveda era um escolástico sem experiência fora do mundo acadêmico e um seguidor da teoria aristotélica segundo a qual seres inferiores são naturalmente escravizáveis.
Assim, para Sepúlveda, os nativos poderiam ser ao mesmo tempo cristãos, para o caso de terem almas a serem salvas, e escravos, para ajudar na pilhagem da sua própria terra.
No famoso debate de Valladolid o Império espanhol pretendia fazer um exame de consciência depois dos excessos da conquista, uma espécie de faxina depois da chacina. O que Las Casas e Sepúlveda estavam realmente discutindo era se índio é gente ou não é gente e, portanto, qual era o tamanho da culpa dos conquistadores.
O fato de os nativos terem almas que respondiam à catequese não provava nada; na época também se discutia, com o mesmo ardor intelectual, se bicho tinha ou não tinha alma. Convencionou-se que Las Casas ganhou o debate, pois tinha os melhores sentimentos cristãos ao seu lado, mas Sepúlveda ficou com a razão.
A pilhagem do Novo Mundo continuou, com a cumplicidade involuntária dos nativos — e continua até hoje. O debate de Valladolid se eternizou. Afinal, os miseráveis do hemisfério são gente ou não são gente?
Os bons sentimentos cristãos de Las Casas impediram que a divisão entre saqueadores e saqueados no continente se aprofundasse ou só serviram para encobrir o abismo com o manto da caridade inútil, que só satisfaz o caridoso?
Por que será que todas as tentativas de romper esta maldição no hemisfério acabam em golpe ou farsa, com os eventuais insurgentes fazendo o mesmo papel de bichos exóticos que os nativos faziam diante dos colonizadores do século 16?
Conforme o adágio, não existe pecado abaixo da linha do Equador. Henry Kissinger, sem saber, fez uma adaptação geopolítica da frase quando disse que ninguém faz história no sul do mundo. O que é outra maneira de duvidar que aqui haja gente, ou pelo menos gente consequente. Talvez por modéstia, não se lembrou de dizer que quando aparece um decidido a não ser mais escravo, como Allende no Chile, é rapidamente abatido.

O que realmente mudou?

Documento especial de 1990, sobre o surfe ferroviário. Várias imagens sobre a miséria que é o subúrbio do rio fde janeiro, hoje são poucos os surfistas, mas o que mudou realmente?