quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

CADÊ A ENGENHARIA?

O que vem acontecendo com os profissionais de engenharia de projetos?

Comenta-se sobre as dificuldades que as empresas prestadoras de
serviços estão tendo para cumprir seus contratos, que a qualidade do
serviço é péssima, que não existem mais os bons profissionais de
antigamente, etc.

Esses e outros comentários vão se confirmando nos projetos mal
pensados, na dificuldade para encontrar profissionais experientes, nas
garantias e seguros que se vão exigindo nos contratos, na lista de
empresas tradicionais que já sumiram do mercado e no surgimento, em
profusão, das "Fulano & Beltrano Engenharia Ltda.".

Em nosso país, a história da engenharia de projetos industriais teve
início com o anseio nacional de não mais importar engenharia embutida
nos equipamentos.

Nos anos 60 surgiram primeiras iniciativas. O grande investidor e
comprador dessa engenharia foi o Estado.

Pagava-se tudo a bom preço.

Muitas empresas se formaram. Pessoas foram treinadas e dignamente
remuneradas. Essa fase atingiu seu ápice ao final da década de 70.
Encerrado esse ciclo, ficou a sensação de que fazer engenharia estava
ficando muito caro.

Nas décadas de 80 e 90, com os recursos mais escassos, buscou-se uma
forma de medir a produção da engenharia. Sem melhor opção passou-se a
medir a engenharia medindo-se a produção de desenhos.

Com isso, chegamos ao estágio atual: mede-se, compra-se e vende-se
engenharia pela quantidade de horas ou de papel produzido: os
desenhos. Essa forma, naturalmente, produziu efeitos negativos na
qualidade.

Para melhorá-la optou-se então pela fiscalização, optou-se por
investir no gerenciamento. Mas, como só fiscaliza ou gerencia bem quem
sabe fazer, para essa atividade são contratados os profissionais mais
experientes.

Com isso observa-se que, via de regra, o conhecimento daquele que sabe
não está sendo usado para fazer, nem para ensinar, mas para pressionar
aquele que, assustado, está começando a aprender.

Como esse tipo de fiscalização ou gerenciamento, obviamente, também já
mostra sinais da sua ineficiência, volta-se a pensar em comprar a
engenharia embutida nos equipamentos "empurrando o fardo" para seus
fornecedores. Fica mais barato - dizem.

Assim, na prestação de serviços de engenharia estamos quase retornando
aos idos de 1960!

Isso mostra, de forma inequívoca, que se está atuando nos efeitos e
não nas causas.

Necessário é, pois, repensar os conceitos e fazer distinção entre
engenharia e desenhos de engenharia.


Produzir desenhos é tarefa mecânica.

Produzir engenharia é atividade essencialmente mental, intelectual.

A máquina de engenhar, de produzir idéias, é a mente humana.

Os softwares dessa máquina são os conhecimentos obtidos em muitos e
demorados "downloads" nos "sites" da vida profissional e a matéria
prima dessa fábrica de idéias é a informação.

Para produzir soluções de engenharia trabalham-se as informações com
os conhecimentos que se tem, conhecimentos estes adquiridos em
projetos passados, em experiências vividas. Se a informação, tal qual
o conhecimento, é incompleta ou ruim, a solução o será na mesma
proporção e qualidade.

Até chegar a ser solução, uma idéia precisa ser processada,
modificada, re-processada e confirmada por cálculos, esboços,
gráficos, etc. E é ao longo desse processo que o profissional se
capacita e dá soluções rápidas e eficazes aos diversos problemas.

O verdadeiro produto da engenharia não é o desenho, é a solução. Sem
ela não há o que desenhar e nem o que construir.

O desenho é, por assim dizer, apenas a embalagem do produto, a imagem
da idéia concebida na mente de um engenheiro.

Por isso, pode-se dizer que os remédios receitados pelos engenheiros são
entregues em caixinhas nos vários tamanhos padrão-ABNT: do A0 ao A4.

E hoje, o computador pode colocar o qualquer remédio em qualquer uma
dessas caixinhas, e até em menores do que essas.

Como medir isso? Como medir a produtividade de um engenheiro? Como
valorizar a experiência acumulada na mente de um profissional? Pela
quantidade de desenhos (caixinhas) produzidos com suas idéias?! Como
uma empresa capacitará e manterá novos profissionais? "Inventando"
caixinhas desnecessárias para ser mais bem remunerada? A realidade do
mercado tem mostrado que vender caixinhas não é bom negócio. Aliás,
financeiramente o bom negócio agora é pressionar (ou fiscalizar?) os
que ainda não sabem nem fazer as caixinhas e nem o que colocar dentro
delas.

Enquanto a solução não vem, será bom fazer uma pausa na maquinação de
contratos tão deprimentes que teve seu ápice nos infames leilões
reversos. Será bom não colocar para concorrer na mesma raia o engenhar
e o desenhar. Será bom que os profissionais experientes não se limitem
a pressionar sem ensinar. Será bom que as Escolas de Engenharia se
aproximem sem ocupar o espaço das Empresas e que introduza em seus
currículos uma disciplina que ensine o aluno a pensar, a usar esse
fabuloso e ainda desconhecido mecanismo mental humano. Será bom que os
que estão começando na profissão, dispondo já dos recursos da
informática, tenham com quem aprender a pensar, a engenhar soluções:
coisas que o computador não faz. Será bom que esses novos
profissionais não confundam saber fazer engenharia com saber usar um
bom software de engenharia.

Finalmente, será muito bom que os mais novos aprendam a pensar para
que não usem o computador para produzir caixinhas de surpresas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

O que realmente mudou?

Documento especial de 1990, sobre o surfe ferroviário. Várias imagens sobre a miséria que é o subúrbio do rio fde janeiro, hoje são poucos os surfistas, mas o que mudou realmente?