Percival Puggina
Em
2001, em visita a Cuba, fui à embaixada brasileira. Ela se situa no
quarto andar do prédio da Lonja de Comércio (Bolsa de Valores), uma bela
edificação do século 19. Conversei com o secretário. Eu queria checar
minhas observações sobre a realidade do país. Durante a entrevista,
entrou na sala uma moça que lhe dirigiu algumas palavras em espanhol e
se retirou deixando expedientes sobre a mesa. Quando ficamos novamente a
sós, ele explicou que a servidora fora contratada junto a uma das duas
agências oficiais através das quais o governo locava mão de obra para
organizações estrangeiras no país. O contratante descrevia o perfil da
pessoa que necessitava, a agência estabelecia o valor da remuneração e
enviava pessoas para entrevistas. No caso, dos 200 dólares com que a
embaixada remun erava a agência, a moça recebia o equivalente (em
pesos!) a 20 dólares. O restante ficava para seu generoso patrão, o
Estado cubano. Portanto, quando eu leio, em várias fontes, que deve ser
nessas mesmas bases o negócio entre Brasil e Cuba (R$ 10 mil mensais
por cabeça para o patrão) e uns 10% disso para os médicos, eu não tenho
por que ficar surpreso. Ouvi esse relato de viva voz. Há muitos anos
sei que o patrão comunista é um velhaco cujos padrões morais causariam
horror a um capitalista do século 18. Meu escândalo com seus abusos já é
bem antigo. Que cidadãos daquele país aceitem morar nos rincões
brasileiros por uma ajuda de custo miserável vale como certidão, passada
em cartório, sobre o que seja viver em Cuba. Não obstante, o convênio
firmado com o ministro da Saúde brasileiro ilustrava orgulhosamente a
matéria de capa do sit e da OPAS na última sexta-feira (http://www.paho.org/bra/ ).
Não se trata, ali, de salários e valores, talvez por falsos pudores. E
ninguém conseguirá arrancar dos profissionais que vierem informação
alguma sobre quanto os Castro lhes estarão pagando para atuarem no
Brasil.
O leitor deve estar se perguntando: "E as famílias deles? Eles não vêm com a família?".
É óbvio que não.O leitor deve estar se perguntando: "E as famílias deles? Eles não vêm com a família?".
Isto está fora de cogitação.
Nestes
casos, tratando-se de cidadãos cubanos no exterior, a família costuma
ser refém do governo, proporcionando relativa garantia de que o infeliz
retornará ao cativeiro. Aliás, estamos diante de um duplo cativeiro
porque também no Exterior a situação desses profissionais seguirá
disciplina própria, para cujo controle lhes costuma ser imposta
fiscalização exercida por agentes do governo cubano. Normalmente, ao
menos, as coisas se passam assim.
E mesmo que esses fiscais não venham, mesmo que não se apliquem ao convênio firmado pelo ministro Padilha as regras vigentes em outros países, já está para lá de configurada uma situação de servidão, de escravidão, de exploração indecente do trabalho humano. Ficou muito claro, também, que essa operação está sendo cozida há muito tempo, à socapa, abordada de modo evasivo pelo governo. Ninguém monta uma operação dessas em uma semana. Há objetivos eleitorais focados nas comunidades interioranas e há Foro de São Paulo nisso.Basta o que se sabe para caracterizar nesse acordo abuso capaz de acionar até os mais ideologicamente focados alarmes dos órgãos de direitos humanos, quer sejam do governo, quer da sociedade. A pergunta que me ocorre nesta sexta-feira chuvosa em que escrevo é a seguinte: "Cubanos não são humanos?"
E mesmo que esses fiscais não venham, mesmo que não se apliquem ao convênio firmado pelo ministro Padilha as regras vigentes em outros países, já está para lá de configurada uma situação de servidão, de escravidão, de exploração indecente do trabalho humano. Ficou muito claro, também, que essa operação está sendo cozida há muito tempo, à socapa, abordada de modo evasivo pelo governo. Ninguém monta uma operação dessas em uma semana. Há objetivos eleitorais focados nas comunidades interioranas e há Foro de São Paulo nisso.Basta o que se sabe para caracterizar nesse acordo abuso capaz de acionar até os mais ideologicamente focados alarmes dos órgãos de direitos humanos, quer sejam do governo, quer da sociedade. A pergunta que me ocorre nesta sexta-feira chuvosa em que escrevo é a seguinte: "Cubanos não são humanos?"
Que Cuba escravize seus cidadãos é uma coisa inaceitável.
E o Brasil convalida isso?
ZERO HORA, 25 de agosto de 2013
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