As agências reguladoras voltam à cena oito meses depois de a ex-chefe de gabinete do escritório da Presidência da República em São Paulo Rosemary Noronha ter sido acusada pela Polícia Federal (PF) de haver usado seu prestígio com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seu amigo íntimo, para fazer tráfico de influência nestes órgãos criados para defender os cidadãos. A Controladoria-Geral da União (CGU) ainda investiga como a quadrilha dos irmãos Paulo e Rubens Vieira beneficiou-se de cargos de direção nas agências de Transportes Aquaviários (Antaq), de Aviação Civil (Anac) e de Águas (ANA), obtidos com a ajuda dela. Mas continua renhida a guerra entre os partidos da base do governo por cargos muito bem remunerados destes órgãos de Estado: seus salários variam de R$ 11.769,44 a R$ 12.388,88.
De acordo com reportagem de Andreza Matais e Débora Bergamasco, publicada noEstado da
última quarta-feira, a disputa política para lotear cargos nas agências
é explícita e consta dos anais que registram os debates no plenário do
Senado, instância à qual são submetidas as nomeações para as diretorias
dessas agências. Nem a saúde, setor social prioritário para qualquer
gestor público que se preze, escapa disso: os exemplos mais recentes
dessa luta dizem respeito a cargos nas Agências Nacionais de Vigilância
Sanitária (Anvisa) e de Saúde Suplementar (ANS), que fiscaliza os planos
privados de saúde.
A
Anvisa, que geralmente atua com cinco diretores para liberar o uso de
remédios e fiscalizar o comércio de alimentos no País, ficou mais de um
terço do ano sem o quadro de dirigentes completo por causa da queda de
braço entre as duas maiores bancadas governistas do Congresso - o
Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido do Movimento Democrático
Brasileiro (PMDB). O militante petista Ivo Bucaresky, indicado pela
seção do partido no Estado do Rio, teve de esperar quatro meses depois
de aprovado na Comissão de Assuntos Sociais do Senado (CAS) para ter o
nome encaminhado ao plenário. Sua nomeação para a Anvisa só foi
confirmada no plenário na sessão de 11 de junho, na qual também o foi o
funcionário Renato Porto, indicado pela CAS seis dias antes e
patrocinado pelo padrinho de casamento, o líder do PMDB, Eunício de
Oliveira, que fez questão de participar pessoalmente das votações.
Na
mesma sessão, Elano Figueiredo foi aprovado para ocupar uma diretoria
na ANS. Em seu caso, PT e PMDB atuaram em consórcio e passaram por cima
da investigação que o indicado protagoniza no Conselho de Ética da
Presidência da República por ter omitido do currículo o vínculo
empregatício com a operadora de saúde Hapvida, conforme revelou oEstado.
As
notas taquigráficas registram os apelos de senadores dos dois partidos
para a aprovação dos três novos diretores. "Peço que, se for possível,
nós votemos, no dia de hoje, não somente os dois candidatos (Porto e
Elano), mas também o dr. Ivo, que está aqui no limbo há muito tempo",
apelou o senador Humberto Costa (PT-PE). O governista Romero Jucá
(PMDB-PR) deu seu aval: "Esperamos fazer uma votação maciça na tarde de
hoje". E a colega Ana Amélia (PP-RS) atendeu ao apelo registrando, "com
muito bom grado", a inclusão de Bucaresky para corrigir a omissão do
nome deste no pronunciamento anterior em que ela havia citado apenas
Porto e Elano. Dos discursos proferidos na sessão, o do líder do PMDB,
Eunício Oliveira, é o que resume de forma mais franca os critérios dos
políticos para nomeação de seus indicados para cargos técnicos.
"Indiquei o menino como técnico. O pai dele teve problema de câncer e
morreu, a mãe está doente. É um rapaz muito sofrido, mas que tem muito
valor, é dedicado, batalhador, fichinha limpa", explicou o senador.
A
forma como o governo Dilma nomeia e o Senado avaliza diretores das
agências reguladoras, criadas para regular e fiscalizar setores cujos
produtos ou serviços afetam diretamente a saúde e a vida dos cidadãos, é
mais uma demonstração cabal de como nossos políticos aviltam na prática
as melhores intenções que na teoria avocam.
Um homem livre é, por força, inseguro. Um homem pensador é, forçosamente, dubitativo. Erich Fromm
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